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quarta-feira, 14 de novembro de 2012

Mosaico V


“- Professor, eu acho que vou escrever assim no meu texto... ‘os livros são janelas que nos mostram o mundo’... o que o senhor acha?
- Eu acho que podemos escrever ‘os mundos’ em vez de ‘o mundo’, pode, professor?
- Professor, eu acho que poderíamos escrever que ‘os livros são portas’ por que janelas é para vermos, mas portas é para entrarmos e conhecermos as coisas e visitarmos as pessoas.”
(nessa hora a fala do professor dá lugar a lágrimas de felicidade)


“Eles têm uma séria dificuldade em perceber conceitos abstratos, linguagens abstratas, pois não alcançam o significado real das coisas e não conseguem perceber nada além daquilo que está concretamente ao seu redor. Imagino que vocês, professores de Língua Portuguesa, devem ter muitas dificuldades para conseguir o mínimo de comunicação e entendimento dos textos. Por que os textos todos possuem linguagem abstrata e quase impossível para eles.”

(nessa hora a fala do professor dá lugar a lágrimas de cansaço e desânimo)

segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Mosaico IV


“- Vocês já entraram em uma livraria antes?
- Não, professor!
- E por quê? Não se paga para entrar em livrarias, além de se poder conhecer os livros, saber sobre outras culturas e pessoas. Vocês não acham isso importante?
- Sim, professor, mas nós pensamos que era um lugar para os malais e não para os timorenses entrar.
- Mas por quê? Tudo o que está em Timor é dos timorenses em primeiro lugar. Vocês podem e devem entrar nas livrarias sempre. Olhar os livros, folheá-los, ler alguns trechos e conhecê-los.
- Os livros são muito caros, professor. Não podemos comprar.
- E qual é o valor que vocês podem pagar para comprar livros?
- 5 ou 10 dólares, professor.
- Muito bem, então se cada um da turma der 5 dólares nós conseguiremos comprar 40 livros de 5 dólares, ou 20 de 10 dólares e colocaremos nesta estante em nossa sala, e os livros serão de todos. Com 5 dólares todos terão direito a 40 livros diferentes! No próximo semestre fazemos a mesma coisa e a quantidade de livros dobrará. Se vocês conversarem com os colegas de outras turmas para fazerem o mesmo, teremos muito mais livros e vocês poderão emprestar a eles e eles emprestarão a vocês!”

(Os olhos brilharam com a possibilidade empreendedora... nunca haviam pensado serem capazes disso... a semente foi jogada e eles começaram a se mobilizar)

“Não consigo ver grandes mudanças em Timor-Leste. As pessoas de aqui são muito acomodadas, sem iniciativas e sem vontade de um real desenvolvimento. Nem sequer falam sua língua oficial. E agora ainda pretendem que a ONU de cá saia, pois acreditam ter autonomia. Nem sequer sabem o que é ter autonomia. O que salva por aqui são as cooperações internacionais. Sem elas não sobrevive-se por cá.”

(Sementes como estas são jogadas a todo instante em Timor, a ponto de atingirem uma força que chega as raias da verdade... só que ao contrário!)

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

Mosaico III


“- Professor, muito obrigado pela oportunidade de visitar o Museu da Resistência. Nem parece Timor-Leste! Tudo muito bonito, muito explicativo e muito real.
- Mas por que não parece Timor? É a história de vocês! Não entendi.
- Está tudo muito bonito. Muito organizado. Parece que é outro país!”

(E brilhavam os olhos do rapaz ao perceber seu país com um tratamento até então dado apenas aos países estrangeiros... algo bonito... admirável... distante... e, agora, ali... presente... Timor!)

“São tão rústicos e simples que custa-se a crer que conseguiram sair dos conflitos. A forma como se portam, as unhas compridas dos homens, a cuspir no chão... as risadas estridentes... tudo parece comportamento quase animal.”

( E meus olhos brilhavam num misto de ódio e pena daqueles que pararam no tempo sem perceber que agora a realidade é outra.)

quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Mosaico II


“- Então, Agostinho, faz assim... reescreva esse seu texto, com bastante atenção às minhas sugestões sobre os plurais, os verbos e a escrita de algumas palavras. As ideias estão ótimas e você entendeu o que eu havia perguntado, agora é só fazermos esses ajustes no texto e ficará perfeito. Parabéns!
- Professor, muito obrigado pelas correções (beija a mão do professor). Vou fazer as correções que o professor pediu e depois posso colocar no mural?
- Claro, Agostinho. Sãos suas ideias, mas todos nós temos o direito de conhecê-las, se você quiser compartilhar conosco. Sem dúvida é muito importante.
- Se eu digo as minhas ideias e se todos os colegas também digam as suas ideias teremos muitas ideias para discutir e escolher as ideias que serão de todos nós, professor. Assim podemos ajudar Timor-Leste!”
(Na sua beleza e simplicidade, um aluno me ensina os princípios da democracia)

“Este povo é preguiçoso e não quer fazer nada para que este país saia da pobreza que tem. Se não fosse os estrangeiros aqui, nós portugueses, os australianos, os europeus de um modo geral, não sei o que seria deste país. Os alunos não possuem problemas linguísticos apenas, mas cognitivos. Não conseguem aprender adequadamente e nem querem fazer um esforço, caraças!”
(Na sua grosseria e prepotência, uma professora me ensina os princípios do colonialismo)

domingo, 4 de novembro de 2012

Mosaico I


“Professor, os malais só tem que vem pra Timor-Leste para ajudar os timorenses. Se não for para ajudar eles não devem de vir. Porque Timor-Leste é a nação mais nova do mundo e precisa de ajuda das nações irmãs para se desenvolver. Timor-Leste agora é terra de paz, de construção. Por isso os timorenses dizem ‘Adeus conflito, bemvindo desenvolvimento’, para que a nação timorense em conjunto com as nações irmãs da CPLP possam seguir adiante, crescer e desenvolver para os timorenses.”

“Nós, portugueses, temos orgulho de manter ótimas relações com as ex-colônias. Todos têm a ganhar com isso. Nesse momento, Portugal passa por uma das maiores crises econômicas de sua história e as ex-colônias são oportunidades de trabalho muito importantes para nós. Em contrapartida, nós podemos ajudá-las a tornarem-se nações melhores, se calhar, bem desenvolvidas!”

(Confronto de falas e falares que despertam fortes sentimentos)