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quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Relatos timorenses II


“- Professor, Timor-Leste vive hoje como um jovem. O que querem os jovens? Aproveitar sua liberdade. Mas isso sempre é perigoso, não é professor? Eu sou mãe de dois rapazes e vivo dizendo a eles que estudem, que consigam trabalhar e que formem uma família respeitosa. Porque o pai deles, seus tios e muitos amigos nossos tiveram que passar pela dificuldade dos massacres de Timor. Meu marido morreu no massacre de Santa-Cruz. E não puderam ver o país livre da Indonésia. Mas meus filhos podem e vão criar os seus filhos com liberdade. Professor, Timor-Leste não precisa ser rico com o dinheiro, precisa ser rico com o respeito aos direitos humanos. Eu vi meu pai ser torturado e morto. Eu e meus irmãos. Foi Deus, nosso senhor, que não permitiu que eu fosse morta. Passei muita fome no campo de prisioneiros. Algumas amigas minhas foram abusadas pelos soldados indonésios. Eu sempre fui feia e isso me salvou. Os timorenses que tinham dinheiro naquela altura já haviam saído de Timor-Leste. Então, professor, não é a riqueza que nos salva, não é a beleza, é a dignidade.
- Mas a senhora disse que seu pai foi morto, seus irmãos, amigos, até seu marido. Por que eles não foram salvos?
- Professor, a dignidade é uma arma muito forte que assusta as pessoas. Os soldados indonésios tinham medo da dignidade timorense. De sua crença religiosa, de sua vontade política. Toda a gente queria Timor-Leste um país com igualdade para todos. Isso assusta. E os soldados tinham as pistolas e outras armas na mão. Para se defenderem da dignidade, matavam as pessoas. Muitas pessoas morreram defendendo a dignidade das pessoas que ficaram vivas.
- E hoje? A senhora acredita que foi válido todo esse sacrifício?
- Não precisava ser assim, professor. Mas a vontade do dinheiro faz as pessoas ficarem malucas e matarem até mesmo as pessoas para terem mais dinheiro. Então, por isso mesmo, é importante que as pessoas lutem por suas vidas, pela vida de suas famílias e amigos. Ou então vamos ser escravos dos mais fortes, não é mesmo, professor?”
(Conversa com uma aluna de 36 anos com aparência de 50 e que hoje trabalha no ministério da Educação em Timor-Leste)

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